terça-feira, 4 de maio de 2010

Poemas para uma emergência
















Morreu Calau Lopes, um dos primeiros amigos que fiz em Petrópolis. Ele era na época diretor do Departamento de Parques e Jardins e começava a recuperar o lago do Cremerie, depois de décadas de abandono. Eu tentava fotografar para um jornal da cidade os patos e marrecos que viviam por lá. Depois disso, Calau entrou para a política, com grande sucesso, e nos distanciamos.
Meu ideal político não sobreviveu aos anos de faculdade. Achava perfeitas as frases de Karl Marx, de que "Um homem angustiado por uma necessidade não tem senso algum, mesmo para o mais belo dos espetáculos" e "De cada um, de acordo com as suas possibilidades, e a cada um, de acordo com as suas necessidades". Mas a leitura dos livros de História e as reportagens mais profundas dos jornais me mostrou que eram apenas frases, que todos os regimes, sem exceção, cometem injustiças, e que os regimes socialistas cometiam mais injustiças que os liberais. Achava romântico Che Guevara lutar pela sua vida contra os militares de governos corruptos em Cuba e na Bolívia, mas não aprovava o Che que mandava opositores políticos para serem fuzilados en el paredón.
Era um prazer conversar com Calau Lopes. Afável, culto,Calau preferia falar comigo sobre outras coisas, que não a política. Rimos muito quando descobrimos que tanto eu quanto ele guardávamos na cabeceira da cama as obras completas de Fernando Pessoa, a que recorríamos como uma espécie de caixa de primeiros socorros, nas mais variadas situações da vida. Vou guardar para sempre a lembrança do Calau que gostava de teatro, que considerava as praças uma espécie de templo para o cidadão comum, e que lia os mesmos poemas de Fernando Pessoa que eu.
Acho que a política fez mal a Calau Lopes. Muita gente vai discordar. Gente que me considera ingênuo, uma pessoa incapaz de ver que é preciso quebrar ovos para se fazer omeletes. Pode ser. Continuo achando que os ovos devem ficar nos ninhos, até que deles surjam novos pássaros que vão levar para o céu azul, em suas asas de liberdade, todos aqueles ideais que acalentamos e que vão sempre renascer em outros corações.

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